quarta-feira, maio 20, 2015

Fazer vinho é canja mas galináceos não fazem parte dos lotes

.
Chrétien de Toyes escreveu e fez-se o Graal.
.
José de Arimateia levou-o e o tempo perdeu-o. Achá-lo só os puros e de merecimento. Sir Galahad, Sir Bors e Sir Percival conseguiram.
.
O Graal desapareceu. Se está escrito, existe. A letra impressa não mente.
.
Muito mais antiga é a demanda da Pedra Filosofal. Tão antiga que, pelos artifícios da alquimia, se descobriram verdades de ciência.
.
Antiga e já conseguida. Cientistas conseguiram fabricar ouro. Ouro que vale mais do que ouro, só um trilionário sem juízo compra esse metal. A natureza vende mais barato...
.
Se bem que o conseguimento não é bem um concretizamento. A Pedra Filosofal tem de transformar em ouro qualquer metal plebeu; os sábios apenas conseguiram fazê-lo e não que consiga metamorfosear qualquer calhau.
.
Ah! O mais prosaico… o Elixir da Eterna Juventude. A morte chega a todos e assusta muita gente. Também os poderosos do mando falecem e temem o dia em que a gadanha os faça fechar os olhos.
.
Com o ouro pagaram a homens de ciência e virtude. Como nos contos das «Mil e Uma Noites», a habilidade estava em conseguir manter o patrono entretido, acreditando que os progressos se faziam.
.
Aldrabão e famoso, o alquimista era chamado à Corte. O ouro tão perto, puro veneno. A cobiça e o pesadelo. A maior competência não era fabricar vida, mas não criar a morte. Ter as perícias para progressos e um sofrimento esperançoso por não ter tido ainda sucesso.
.
A vida eterna é no Além. Ou… a espada, cutelo, machado, garrote, forca ou. O fabuloso mercúrio. O mortal mercúrio.
.
Todos os mestres foram um dia aprendizes, mais tarde ainda esperaram como oficiais. Entre os mestres, uns melhores do que outros – nunca esquecendo que dois mais dois podem não ser cinco.
.
Johann Wolfgang von Goethe poemou «O Aprendiz de Feiticeiro», que não poderei ser. Acreditei nos livros das ciências sem mestre e montei um laboratório com os ingredientes e ferramentas, sabendo colher dos mestres o conhecimento aproveitável, vinho monovarietal engarrafado.
.
Em segredo comprei as essências e pela noite até de manhã nada mais fiz do que procurar o Graal, a Pedra Filosofal e o Elixir da Eterna Juventude.
.
Vinho!
.
Não sei que horas eram quando finalizei a poção. O melhor vinho do mundo!
.
Engarrafei-o em frascos de perfume de sete decilitros e meio, devidamente rolhados. Sobre o todo, lacre, como antigamente.
.
Exausto adormeci, sonhando com Xerazade, Isolda, Julieta, Dulcineia, Dinamene, Bela Adormecida e Maria Carolina de Bourbon Duas Sicílias.
.
Ainda fatigado, revelei o vinho – Elixir da Eterna Juventude, Pedra Filosofal e Graal.
.
Não tentem fazer isto em casa. Dos vários escolhidos, enófilos de escol ou só de folia, recebi um quase unânime:
.
– Não é bom. Acho que nem é propriamente mau, é muito esquisito.
.
Houve um que sentenciou:
.
– É uma grande…
.
Se tivesse sido um êxito, não revelaria a fórmula. Para memória de chacotas futuras, deixo a composição:
.
Encruzado (15,3%), arinto (15,3%), chardonnay (15,3%), touriga franca (15,3%), alicante bouschet (15,3%), loureiro (7,7%) touriga nacional (7,2%), alvarinho (5,7%) e syrah (2,9%).
.
Era suposto ser palheto, mas só consegui tinta de escrever, mas em encarnado.
.
Com as sobras aproveitáveis criei uma pujança, uma espécie de tiro da Big Bertha, por isso dei-lhe a alcunha de Thor. Alvarinho (40%), syrah (33,4%) e touriga nacional (26,6%). Um pouco mais bronzeado do que o anterior, e mais bebível.
.
.
.
.
.
.
.
.
.
Nota 1: Por incapacidade da caixa de etiquetas, deixo aqui a relação dos artistas cujas obras tiveram a infelicidade de ilustrar o meu vinho... Lawrence Alma-Tadema, Paul Delvaux, André Derain, Ticiano, Constant Troyon e Mårten Eskil Winge.
.
Nota 2: A imagem principal designa-se por «O Alquimista» e é de autoria desconhecida, mas enquadrável no género alemão, estando datada de 1880.





1 comentário:

Anónimo disse...

felizmente fui um dos provadores da mistela...o que prova que a enologia não é para todos...